SOBRE FALHAR E RECOMEÇAR: Como perdi o controle e voltei a engordar

Dos 30 kgs que perdi, engordei 6 de volta. Mas a vida segue. Eu estou até conseguindo ficar sem camisa de vez em quando. Venho tentando passar por cima das falhas e tentar voltar para a dieta e continuar emagrecendo. Eu ainda preciso perder 15 kgs. Somando aos 6 que engordei, são 21kgs a eliminar. Foi fácil da primeira vez, agora tá difícil.
fotos: Silvershark / Diogo Machado / Reprodução.
Parei de emagrecer quando a vida parecia já bela o suficiente para eu conseguir relaxar. Quando entrei na dieta, eu não tinha nada a perder e meu único objetivo naquele ano era emagrecer. E me joguei completamente. Os primeiros 20kgs saíram de mim feito água corrente, rápido e fácil. Penei pra perder os últimos 10. Durei apenas uns 6 meses sem engordar... e falhei.

Voltei a engordar no meio do ano passado. Viagens, um namorado chef de cozinha, novos amigos e novos lugares. Eu tava já bem mais magro, lindo e muito feliz. Perdi a mão, me soltei e relaxei. A gente acha que tem controle do nosso corpo porque emagrece rapidinho e se sente o rei do mundo. Eu consegui emagrecer depois de 25 anos! Eu tenho controle! Não vou engordar de novo, é só um jantar, é só uma cerveja, estou em NY, dane-se. Mas a gente engorda. O negócio da dieta lowcarb é que basicamente ela corrige os mecanismos que te fazem engordar, mas não é permanente. Quem tem problema de peso tem esse mecanismo gravado a ferro no organismo. E é difícil demais desligar essa chave pra sempre. A gente vai ter que lutar pra sempre contra isso. 

Quando eu tava emagrecendo e vendo meu corpo mudar completamente, a alegria que eu sentia era tão grande que eu lembro de me olhar no espelho e prometer a mim mesmo: eu nunca mais vou passar por isso. Eu não conseguia imaginar que um dia eu voltaria a ser como eu era antes; comendo enlouquecidamente, morrendo de calor e suando a qualquer caminhada, sentindo falta de ar e roncando a noite. Eu não conseguia conceber a ideia de que eu um dia voltasse a ser gordo. Todos os meus traumas e dramas e medos eram e são, na sua maioria relacionados ao meu problema de peso. E eu não queria nunca mais passar por isso. 

Quando eu saí da dieta pela primeira vez, eu estava feliz e experimentando. Eu fui pra NY e comi pizzas, hotdogs, bebi cerveja e aproveitei todos os minutos, porque afinal era uma viagem e tava tudo bem. Quando comecei a namorar com um chef de cozinha, eu comia as comidas dele com felicidade, era uma experiência nova e única. Eu não via esses acontecimentos como o fim do mundo e o início da minha decaída. E não era! Eu estava experimentando e acabava nem engordando. O que me fez perder a linha foi a desassociação de comida como uma coisa boa. Quando a comida voltou a ser motivo da minha tristeza, eu me perdi de novo.
fotos: Florian Klauer / Fábio Lamounier  / Reprodução.
Comecei a me desprender da dieta sempre com a desculpa de que agora eu poderia aproveitar a vida e rapidamente voltar a emagrecer. Achava que fazer dias livres era normal e absolutamente administrável. Das vezes que engordava por ter comido muito no final de semana, perdia rapidinho ao voltar pra dieta. Mas uma hora eu perdi o controle. Voltei a comer compulsivamente, sentindo o prazer de cada garfada de macarrão e cada mordida de chocolate. Mas o problema maior foi quando o prazer virou culpa e eu comecei a desenvolver todos os hábitos não-saudáveis com a comida que eu tinha antes de emagrecer. A compulsão trouxe a raiva da culpa, a vergonha da mentira e o medo de engordar de novo. 

Eu me peguei várias vezes comendo escondido, sem contar pra ninguém. Falava que tinha jantado salada mas tava comendo nuggets em casa. Voltei a tentar resolver minhas frustrações com comida - qualquer problema no trabalho eu usava como desculpa pra comer uma barra de chocolate. Se no meio da semana eu estava estressado, adiantava meu "dia do lixo" pra comer um monte de porcaria, me iludindo que no dia seguinte eu voltaria pra dieta e no final de semana iria segurar a onda. Mas de 7 dias numa semana, 4 eu estava me sabotando. Mas a pior parte foi ainda usar a dieta lowcarb como um comportamento compensatório, uma das principais características de quem tem distúrbio alimentar. Fazer dieta se tornou a minha bulimia. 

Comecei a enxergar a dieta como a minha punição por ter comido errado. Depois de uma semana difícil em que eu tinha jacado muito, eu passava um domingo inteiro em jejum. Ah, todo mundo faz jejum intermitente, tá de boa. Depois de uma semana inteira comendo porcaria, eu decidia que o domingo era meu novo início, faria jejum pra na segunda já acordar em cetose e seguir a vida de novo da dieta. Passei a usar a dieta lowcarb como válvula compensatória, o preço que eu tinha que pagar pelo meu mal comportamento. Eu tinha que ficar de jejum no domingo e passar fome pra saber que não foi fácil emagrecer, e pra me punir de toda a porcaria que comi naquela semana. Eu voltei a ter uma relação doentia com a comida, mesmo fazendo dieta lowcarb. 
fotos: Rachael Gorjesta / Tyler Nix / Reprodução.
Quando entrei na dieta lowcarb, admirava o conceito todo de comer comida de verdade, retirar todos os alimentos processados e industrializados, ficava realmente feliz de saber que aquilo tudo que eu comia iria me servir de combustível e me ajudar a seguir em frente na busca de uma vida saudável – e em consequência emagrecer. Agora eu achava que a dieta era a única saída pra me tirar do buraco sem fundo que era estar de novo comendo compulsivamente e querendo vomitar tudo depois e eu perdi completamente a perspectiva.

Eu me esqueci que o segredo de sucesso para o emagrecimento é encará-lo com alegria, com aquela disposição de quem quer vitória – e não como uma derrota. Enquanto eu visualizei a dieta como uma sina, não consegui voltar ao eixo. Enquanto eu me punia com jejuns e saladas minúsculas, nada mudava. Não emagreci 1kg. E foi assim que eu percebi o maior desafio pra uma pessoa que luta contra o peso: ela mesma. 

Encarar os seus problemas de forma feliz e saudável não é fácil. Ainda mais quando esse “problema” é a sua pele, o seu corpo, o único e maior lugar que você habita nesse mundo. Lidar com seu próprio corpo, é lidar com sua alma e todos os seus maiores medos. A única forma possível de passar por tudo isso sem enlouquecer é entender que comida não é veneno, mesmo que te faça engordar. A gente tem que encontrar um equilíbrio. 


fotos: Diogo Machado / Michele Feola /  Reprodução.
Cuidar de si mesmo através da sua alimentação deve ser visto com beleza e carinho. E só agora eu começo a perceber esse meu erro... Pouco a pouco venho tentando me lembrar que errar faz parte. Mas mais ainda, preciso me lembrar que engordar não é um erro. Engordar é infelizmente o que meu corpo tá acostumado a fazer, e só isso. É possível controlar isso de forma saudável. Eu preciso lembrar que eu quis emagrecer pra corrigir esse detalhe e tentar ser mais feliz. Eu quis emagrecer pra justamente não ser refém da comida e do meu corpo e mais uma vez eu ainda me sentia refém, tanto pelo bem como pelo mal.

É preciso deixar de visualizar a comida como um problema. É por isso que sou contra o termo “dia do lixo” – comida não deve nunca ser comparada à lixo! A comida é o nosso combustível, o que nos faz sobreviver. Mesmo que ela te engorde, seja feliz e coma. Engordar não é o fim do mundo. Nunca faça dieta como punição, mas também não se prive como punição. Se você precisa emagrecer e acha melhor não comer aquele hambúrguer, faça-o como um presente e uma alegria. Você está se dando este luxo, e não um martírio. Você voltou pra dieta porque quer emagrecer e ser feliz e saudável, e não porque comeu demais e precisa compensar pra estar em paz.

Eu preciso me lembrar que meu maior objetivo é ser feliz e é isso que vai me trazer paz. Viver os dias sem pensar em comida, ou porque vai me engordar ou porque vai me ajudar a emagrecer. Eu voltei pra dieta mas tentando me lembrar todos os dias que é só uma parte da minha vida, e não o todo. E eu tento me lembrar todos os dias que esses sabores da vida estão aqui pra me ajudar nesse caminho – a ser feliz tomando aquele sorvete de vez em quando e a emagrecer comendo bem diariamente. O resto é a vida que vai batendo na porta e nos ensinando a encarar os desafios com amor,  entender e aceitar as falhas e tropeços do meio do caminho e, principalmente,  a recomeçar todos os dias.

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